Por: Alexandre Mendes
Já fazia um tempo que não usava a minha imaginação para ganhar dinheiro. Costumava colocar a melhor roupa que tinha, me barbear e me dirigir até a zona sul. Fazia uma rota pelos pontos de ônibus da Praia de Icaraí e adjacências, abordando as belas senhoras que eu acreditava serem moradoras da região. Meu sermão era, mais ou menos, assim:
- Bom dia, senhora. Eu vim de Itaboraí (ou qualquer outro lugar distante dalí) para ver um emprego de serviços gerais naquele prédio (apontava para qualquer um) e quando cheguei, haviam dado a vaga para outro. Poderia me ajudar com um vale transporte ou qualquer quantia em dinheiro, para que eu possa voltar pra casa? (que cara de pau!)
Conseguia, com essa façanha, garantir as duas sacolas de compra até o meio dia. Era magnífico! Mas o meu forte nunca foi pedir esmolas, sempre me sentia muito mal com isso.
Guardava as segundas feiras, pela manhã, para procurar emprego. Mas, puxa! Como era difícil! Ainda não tinha conseguido a porcaria do certificado de dispensa do quartel e, por isso, nenhum lugar me empregava. Em casa, duas bocas para alimentar e um faminto para nascer...
A minha cara já estava batida naquela rota e eu temia ser descoberto. Eu era um criminoso facilmente enquadrado no artigo 171.
Tentei lugares mais longínquos, como o Fonseca ou Santa Rosa, mas a minha estorinha não fez tanto sucesso nesses bairros. Precisava trabalhar de verdade, novamente.
Foi quando um vizinho de parede, no cortiço em que eu estava hospedado, me chamou para trabalhar nas obras da nascente Barra da Tijuca. Instalar piscinas de fibra nos casarões, me pareceu muito agradável. O salário não era dos melhores, mas não tinha muita escolha.
Então, me tornei um servente de obras.
A equipe era composta por um mestre, um meio oficial de pedreiro e um servente que, nesse caso, era eu.
Ficávamos cerca de três dias, dormindo nos cômodos mal acabados dos casarões, sem iluminação. As muriçocas gigantes não incomodavam tanto na hora de dormir, pois trabalhavamos do nascer ao pôr do sol. e, quando me deitava no papelão, parecia estar morto de verdade. Quando o dono da loja de piscinas ligava, apressando a entrega do serviço, eu continuava cavando o buraco da piscina, com o auxílio de uma lamparina. Certa vez, estava tão cansado que não conseguia erguer a lata de margarina cheia de concreto, improvisada de balde. Carregava-a na altura da cintura e isso fez com que o cimento escorresse para dentro da minha bermuda. Puxa! Como doeu na hora de urinar!
E foi assim que aprendi. Nunca mais deixei as minhas partes mais sensíveis entrarem em contato com o cimento.
Esse trampo de trabalhar com suas memórias está muito bom.
ResponderExcluirParabéns
Cara, gostei da sua escrita. São realmente memórias? Isso não é o mais importante, o fato é que gostei do realismo, do humor-trágico (o cimento caindo no pau da cara)... gostei.
ResponderExcluirMuito foda, acontece tanta coisa no trabalho, depois que acontece a gente fica mais cabrero.
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