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quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Memórias de um operário XIII

Por: Alexandre Mendes


Houve um acontecimento que marcou a minha vida, no momento em que a obra de Vista Alegre acabou e, simultaneamente, discuti com as donas do trailer, abandonando o serviço.  Fiquei perdido e atordoado com a situação financeira em que me encontrava. A geladeira vazia e as contas atrasadas.

Quando o dono da casa começou a me cobrar os três meses de aluguel atrasado, todo dia, acabei pirando com a situação. Saia de casa, cedo, e não encontrava trabalho. Estava desacostumado com as ruas. Tentei voltar, mas acabei falindo. Fiquei completamente sem dinheiro. 

Lembrei-me do revólver calibre 32, que comprara anteriormente, pensando na segurança da minha família enquanto trabalhava no trailer. Até então, a peça não havia tido utilidade alguma para mim. Além do mais, eu nunca cheguei a atirar com a arma e, no final, quando eu a vendi, já estava bem enferrujada por falta de lubrificação.


  Sentia muito ódio no meu coração. Precisava trabalhar, mas não achava emprego. Apareciam de repente, trabalhos de venda sem remuneração fixa. Andar o dia inteiro tentando vender dez planos de saúde, com um nome que ninguém nunca ouviu falar antes. Não, nem tentava trabalhar nessas merdas.

Coloquei a arma na cintura, olhei ao meu redor. Precisava manter a casa intacta, a qualquer custo. Despedi-me de minha família (Davi não havia nascido ainda) e caminhei na direção do ponto de ônibus, por volta de umas onze e meia da noite.

Minha esposa chorava e implorava para que eu não fizesse aquilo. No entanto, a sua choradeira foi em vão. Eu estava decidido a trazer o dinheiro suficiente para acertar as dívidas e encher a geladeira.

O suor e o nervosismo tomaram conta de mim. Dois faróis enormes surgiram no horizonte. Fiz sinal. O ônibus parou.

Subi as escadas do coletivo e olhei para a cara do cobrador. Ele estava conversando com um cara sinistro. Não tive coragem de sacar a arma. E se o camarada estivesse armado? E se eu fosse obrigado a disparar a minha arma? E se eu caísse morto? Sairia na primeira página do jornal: “Morreu o bandido que nunca roubou.“

- Posso dar um vôo, por debaixo da roleta?- O cobrador consentiu. Puxa, que momento estressante!

Desci, logo em seguida, uns oito pontos depois. Percebi que seria muito mais difícil do que havia imaginado.

Tentei o ato por três noites seguidas e nada. Entrava e saia dos raros ônibus que rodavam durante a madrugada, os chamados “serenos”, tentando criar coragem de tomar algo valioso de alguém.  

Foi aí que percebi que não havia nascido para a vida fácil. Precisava voltar a trabalhar, o mais rápido possível.

 Fiz, então, as pazes com as donas do trailer e voltei a trabalhar no turno da noite.


3 comentários:

  1. Na verdade você viu que a vida fácil não era tão fácil.

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  2. Vida fácil, meu irmão, você terá em breve. Depois de tanta luta, de tanta batalha na vida, de tantos leões mortos, tenho fé desde que tínhamos uns 15 anos que você prosperará. Eu vou ter estes empreguinhos e serei sempre este cara burocrático, com uma porção de funcionários me odiando e recebendo meu salariozinho. Mas você que já fez de quase um tudo na vida, vai prosperar. Desde criança eu sei disso... Persista, não desista. Parece aqueles textos de filmes americanos da década de 80 mas é a mais pura verdade.
    Torcendo a distância pelo seu sucesso como sempre.

    Um forte abraço do seu irmão que te adora e tá aqui pro que der e vier.

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